O teste de autocontrole (também conhecido como teste do chocolate) tomou as redes sociais das mamães e papais e virou febre neste início de ano. Basicamente, este desafio que está por todas as partes das redes sociais se trata de uma “brincadeira” entre pais/mães e filhos.

Entretanto, há alguns aspectos deste teste de autocontrole que parecem não estar sendo levados em conta pelos adultos. Evidente que nenhuma mãe, pai, avó, tia ou irmã mais velha tem intenção de prejudicar a criança. Por isso, neste artigo você conhecerá um pouco mais sobre o desafio, o que pode estar por trás dele e quais são algumas consequências possíveis para a criança. Boa leitura!

Teste de autocontrole nas redes sociais

criança menino chocolate teste de autocontrole redes sociais

Crédito: Freepik

Simples de ser compreendido e aplicado, o famoso teste de autocontrole é um desafio onde o pai ou a mãe (ou qualquer adulto que queira fazê-lo) coloca um chocolate ou um doce qualquer da preferência da criança na frente dela. A partir disso, o adulto diz que vai sair e que a criança só poderá comer o doce quando ele voltar.

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Então, o adulto sai e a criança fica sendo gravada. Evidentemente, a gravação tem como objetivo registrar a reação da criança frente ao conflito “desobedecer o adulto e se satisfazer com o chocolate” e “obedecer o adulto e não comer o chocolate (ainda)”. Posteriormente, os adultos publicam os vídeos nas redes sociais para todos verem a reação da criança.

As possíveis reações da criança são muitas, como:

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A grande maioria das pessoas que assiste aos vídeos do teste de autocontrole acha a reação das crianças uma graça e vai correndo preparar tudo para fazer com seu filho também. Entretanto, há algumas perguntas que parecem não estar sendo feitas pelos adultos que se propõe a replicar este desafio, por exemplo:

  • Qual a real motivação disso?
  • É realmente o autocontrole da criança que está sendo medido?
  • Quais consequências podem haver para a criança?

O experimento do marshmallow: A origem do teste de autocontrole nas redes sociais

marshmallows coloridos

Crédito: Freepik

O teste de autocontrole que virou febre em 2020 parece ser uma ramificação de um experimento antigo e muito famoso: o experimento do marshmallow.

Este experimento original ocorreu entre a década de 60 e 70 e foi conduzido pelo psicólogo e pesquisador Walter Mischel. O objetivo do estudo era compreender melhor sobre os mecanismos que contemplam a capacidade da criança de adiar recompensas.

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De forma simplificada, a criança era apresentada a um pequeno doce, como um marshmallow. Então, o pesquisador fala para ela que a criança pode escolher entre comer o doce naquele momento ou aguardar cerca de 15 minutos, pois ele vai sair mas logo que ele volte a criança ganharia um segundo doce e poderia comer os dois.

Muito diferente do atual teste de autocontrole, o experimento em questão era conduzido por uma equipe de pesquisadores qualificada, tinha um objetivo bem específico e um público definido.

Aliás, as crianças que participavam precisavam ter entre 7 e 9 anos, ou os resultados seriam comprometidos e não teriam nenhum sentido. Ou seja, aplicar o teste em crianças com menos de 7 anos dificilmente trará resultados fidedignos. Isso porque as crianças muito pequenas ainda não desenvolveram adequadamente o psiquismo necessário para avaliar as duas alternativas e tomar uma decisão.

Os resultados do experimento

criança comendo marshmallow em teste de autocontrole

Crédito: Freepik

Evidente que algumas crianças conseguiam esperar para ganhar o segundo doce, enquanto outras não esperavam nem o pesquisador sair da sala para devorarem o primeiro marshmallow oferecido no estudo.

A pesquisa acompanhou a vida das crianças que participaram do estudo ao longo dos anos. Isso porque um dos objetivos do estudo era compreender se as condições/capacidade da criança de aguardar uma recompensa melhor no futuro (mesmo em frente a uma tentação) têm influência no seu desempenho na vida adulta. Ou seja, a pesquisa estava avaliando se crianças com melhor autocontrole teriam o desempenho igual, melhor ou pior que outras crianças, com menor capacidade de autocontrole.

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O principal resultado do estudo demonstrou que as crianças que conseguiam esperar (ou seja, as crianças que tinham mais autocontrole) tiveram muito mais sucesso na vida adulta. Foi descoberto que as crianças que conseguiram esperar até a chegada do segundo doce apresentavam na vida adulta:

Estes resultados levantam a hipótese de que além do autocontrole, estas crianças também apresentaram ao longo da vida maior raciocínio estratégico e mais capacidade para simular cenários e escolher as melhores opções.

O que está sendo medido?

profissional especialista

Crédito: Freepik

Rita Calegari é psicóloga e coordenadora psicossocial de toda a rede de hospitais São Camilo (SP) e alerta para o seguinte: “O teste do marshmallow e este teste de autocontrole são completamente diferentes. O primeiro foi um estudo sério e de longo prazo que se iniciou nos anos 60. Ele buscava relacionar a capacidade de autocontrole da criança com o seu sucesso na vida adulta. Essa nova versão caseira é um teste vazio e que não mede autocontrole nenhum. No máximo, ele apresenta a obediência da criança e o medo que ela sente dos pais, já que não há nenhuma regra clara ou combinação entre as partes. Neste segundo caso, não há nenhuma motivação para a criança cumprir um combinado, ela apenas é estimulada a esperar porque o adulto mandou“.

Além de Rita, muitos outros especialistas de infância também fazem o mesmo alerta: o teste sequer deveria se chamar dessa forma, uma vez que não se trata de um teste, propriamente dito. É claro que no contexto da brincadeira não há nenhum problema de propor o desafio para o pequeno. “Entretanto, o resultado obtido não revela absolutamente nada sobre a criança, além do medo que ela pode sentir dos seus pais”, defende a psicóloga Mariana Bonsaver, da Maternidade Pro Matre Paulista (SP).

Consequências possíveis do teste de autocontrole

criança menina com tablet tecnologia

Crédito: Freepik

Além disso, muitas psicólogas infantis alertam para as possíveis consequências da exposição dos vídeos nas redes sociais. Isso porque os papais e mamães parecem não se atentarem para um fator crucial: é o seu filho que está sendo exposto, e em uma situação bastante desfavorável.

Algumas das reações dadas pelas crianças quando submetidas a este teste de autocontrole podem ser consideradas bastante constrangedoras. Por isso, ainda que não haja nenhuma maldade, é possível que expor estes vídeos constrangedores de crianças nas redes sociais para todos assistirem, rirem e comentarem sem qualquer cautela pode acarretar em problemas sérios para a autoestima, autoconfiança e saúde na relação da criança com o adulto envolvido.

Na verdade, alguns estudos mais recentes já demonstraram que cuidadores (pais, mães, avós, tias e etc) que expõe excessivamente a criança em redes sociais ou que expõe a criança em situações que podem ser consideradas constrangedoras contribuem para o desenvolvimento de um adolescente e de um adulto com menos autoconfiança e que têm mais dificuldade de confiar nas pessoas.

Os especialistas acreditam que estes resultados possuem relação com um raciocínio de sobrevivência simples, mas que os adultos não costumam levar em conta: Se esse adulto que me ama, me cuida e me protege está me colocando em situações hostis (como a exposição), o que as outras pessoas não são capazes de fazer comigo?

Autoritarismo do adulto?

Pai bravo brigando gritando com filho criança

Crédito: Freepik

Alguns especialistas em desenvolvimento infantil alertam para o fato de que este tipo de desafio pode reforçar sentimentos negativos na criança. Ao que tudo indica, a sensação mais provável de jogos deste tipo seja a noção de autoritarismo e submissão. Isso porque a criança é estimulada a abrir mão de uma satisfação/desejo sem que haja uma combinação estabelecida.

A circunstância do experimento original é diferente porque não é solicitado que a criança não coma, é apenas dado duas alternativas para ela escolher. Aqui, entretanto, a criança “aprende” que não deve comer o doce simplesmente porque o adulto assim mandou.

Evidente que isso não significa que o desafio de forma isolada vai gerar sérios traumas na criança. A questão é o que ele ensina ao pequeno.

Mas, o que será que o fascínio por este jogo diz da realidade atual? De acordo com a Dra Rita, a popularidade do desafio pode ter relação com a noção inconsciente dos pais de que as crianças devem, sim, fazer o que eles mandam só porque eles mandaram. Neste caso, que marcas estão sendo impressas às crianças?

Naturalmente, o desafio pode ser utilizado como uma brincadeira. Entretanto, o ideal é estabelecê-lo de uma forma que a criança tenha escolhas. E, é claro, nunca utilizar o resultado para “diagnosticar” alguma coisa sobre o pequeno. Isso porque testes caseiros com a família não são capazes de mensurar nada da personalidade da criança para além da própria relação do pequeno com a família.

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