Tem dias em que você levanta, corre até o berço, amamenta, troca a fralda, coloca para arrotar. E quando você acha que conseguirá tomar um copo de leite de café da manhã, você ouve aquele barulhinho dizendo que um novo cocô veio, e que você terá que trocar seu filho novamente. Puxa, um barulhinho tão pequeno, mas com um efeito tão grande. Ele ativa algo em seu cérebro, aquela parte que dizia: “calma, você está quase conseguindo! O gostinho do copo de café com leite já está na boca, basta mais um minuto para que você chegue lá”. Aquele barulhinho, com a rapidez de um furacão, cala aquele pequeno prazer que você estava sentindo, talvez um dos poucos do seu dia. Você sabe que não será mais um minuto até chegar o café, serão mais cinco, ou dez, se outra coisa não acontecer no meio do caminho. Então você não consegue impedir as lágrimas de caírem. Por uma simples fralda.
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Tem dias em que você se olha no espelho, e já não vê aquela menina bonita que costumava ver. Os cabelos tão sedosos estão opacos, e muitos fios se perdem pelo caminho. Ao olhar para o chão você acha que não conseguirá impedi-los, todos, de cair de uma vez – é possível que até tenha pesadelos com isso. Mas você não desiste de ver aquela menina de novo no reflexo, pelo menos de relance. Enquanto seu filho dorme, você decide passar uma maquiagem, tirar o rabo de cavalo e pentear os longos cabelos, que agora cobrem os peitos. Você abre o armário e, mesmo sabendo que não terá um jantar romântico, ou que sequer dará um passeio pelo bairro – é muito mais provável que o máximo que consiga é dar um passeio nas áreas comuns do condomínio, se o vento não bater forte – pega aquele vestidinho de que gosta tanto. Veste, dá um sorriso, e por um instante você acha que aquela menina bonita ainda está lá. E é então que acontece: seu filho chora, você o pega no colo, e o coitadinho, que chorava de desconforto simplesmente vomita, aliviado por estar em seus braços. Se cabelo, suas mãos, seu vestido estão sujos, mas você só se dá conta cinco minutos depois, quando já socorreu a criança, a limpou, a trocou. E então você não consegue evitar as lágrimas. Sim, foi só um vômito, mas ele varrer a menina bonita para fora do espelho, e certamente ela não vai querer voltar tão cedo.
Tem dias em que você já vê a linha de chegada. E quando seus ossos e músculos parecem fraquejar, como se tivessem corrido uma maratona, você encontra uma força extra que vem da alma, para percorrer os últimos metros. Para você, a linha de chegada pode ser a comemoração do aniversário de casamento num restaurante bonito da cidade (meses depois de nunca ter saído de casa depois das 19h), pode ser uma viagem em família, tendo-a planejado minuciosamente para que enfim você, seu marido e seu filho tivessem um momento feliz, sem as costumeiras interferências ao redor. E ao faltar apenas dez metros, vem uma pedra, jogada por um descuidado da torcida, que atinge sua cabeça (para a pedra, imagine que seu filho ficou doente, bem na véspera do evento. Ou que o chefe do seu marido marcou um compromisso na hora do jantar, e a que ele precisará ir se não quiser perder o emprego). Você cai, desmaia, perde a corrida. Quando acorda, já levaram o prêmio, a fita da chegada. Você só consegue olhar para frente e chorar, esperando que daquele choro, como acontece nos contos de fada, surja uma planta mágica que mudará o final da história. Só que não muda, e você segue sabendo que na vida real, se a Cinderela perde o baile, não há fadas madrinhas para consertar o vestido a tempo.
Tem dias, nessa vida de mãe, em que você vai não conseguirá conter as lágrimas. E em que as pessoas mais próximas tentarão te consolar, com a maior boa vontade do mundo, dizendo que Deus sabe o que faz, que um dia você enxergará o lado bom disso. Te dirão coisas em que você, parcialmente, até acredita, mas sabe que não vão mudar aquela falta de ânimo, o buraco na alma, que você sente naquele momento.
E só restará a certeza de que vai passar, porque pela experiência que você tem até hoje, isso não falha. Tudo passa.