A pandemia do novo coronavírus trouxe novos desafios para todos. Com tantas mudanças ocorrendo de forma tão rápida e com tantas incertezas, a ansiedade é algo que se faz cada vez mais presente.
Assim como entre os adultos, este momento também traz medos, ansiedade e incertezas para as crianças. As crianças estão vendo seus dias totalmente diferentes e não compreendem bem o que está havendo. E pior que isso: elas estão ouvindo nossas conversas e as notícias na TV. As crianças estão captando que há algo no ar, que há algo ocorrendo. Entretanto, elas não entendem bem o que é que está havendo, nem porquê isso está acontecendo ou quando vai terminar.
Por isso, é muito importante que os adultos conversem com seus filhos e expliquem a situação. Claro que essa conversa precisa levar em conta a idade da crianças e as suas condições de compreenderem o cenário. Veja neste artigo porque é tão importante que essa conversa aconteça. Boa leitura!
Pandemia do novo coronavírus e rotina das famílias
Família com máscaras de proteção em fundo neutro – Foto: Freepik
A pandemia do novo coronavírus acabou afetando a rotina de todos. O fechamento das escolas foi uma das primeiras mudanças importantes que ocorreram. Afinal, com as escolas fechadas a rotina tanto das crianças quanto dos adultos mudou, não é mesmo?
Inclusive, o período em que os adultos ainda estavam precisando sair para irem trabalhar e as escolas já estavam fechadas foi considerado por muitas mães um dos momentos mais difíceis de conciliar. Como ir trabalhar se a escola das crianças está fechada? Onde e com quem deixar as crianças?
Neste período, a saída para muitas famílias seria deixar as crianças aos cuidados da avó. Mas neste momento isso era algo muito delicado, não é? Isso porque os idosos são justamente o grupo de maior risco. Como deixar crianças que talvez estivessem assintomáticas em contato tão próximo com os avós, que são justamente aqueles que podem sofrer mais severamente com o vírus?
E depois que boa parte das empresas suspendeu as atividades ou migrou para o modelo home office? Então agora o problema estava resolvido, certo? Bem, ainda não. Como trabalhar com as crianças em casa exigindo atenção, contato, tempo e tudo mais?
Sim, a pandemia do novo coronavírus chegou e desde o princípio está modificando a rotina das pessoas ao redor do mundo. Claro que algumas famílias têm condições de lidarem melhor com a situação do que outras. Claro que as pessoas enfrentam esse desafio de formas muito particulares. Mas a realidade é que todos estão precisando lidar com essas mudanças, mesmo que cada um faça a seu próprio modo.
O ato de conversar com crianças
Pai e filho usando computador juntos e conversando – Foto: Freepik
Infelizmente, muitas famílias não compreendem a importância de estabelecer diálogos com as crianças. É muito comum encontrarmos famílias onde as crianças sabem sobre o que acontece a sua volta somente através da escuta da conversa entre adultos. Nestas famílias, as crianças não são chamadas para conversarem, para receberem dos adultos informações sobre seu entorno e nem para serem ouvidas em seus medos e angústias.
Por exemplo, é muito comum casais que vão se separar tomarem a decisão e não a explicarem aos filhos. Claro que explicar não é o mesmo que “pedir autorização” nem transmitir informações desnecessárias. Isso porque muitas famílias usam do argumento de “explicação para a criança” como uma forma de tentar colocar o filho contra a mãe ou o pai, a depender de cada caso.
É importante que a criança tenha momentos de diálogo com os adultos. Estes momentos devem servir para ajudar a criança a compreender o que está havendo. Mas é claro que estes espaços também precisam levar em conta a faixa etária e as condições da criança entender. Por isso, é importante que a forma de falar esteja adequada a capacidade de absorção da criança (capacidade cognitiva e emocional).
A “conversa difícil” com as crianças
É natural que alguns assuntos sejam mais difíceis de serem falados e explicados às crianças do que outros. Por exemplo, falar sobre a mudança de residência que vai acontecer porque o papai vai trabalhar em um cargo melhor é bem mais fácil de ser enfrentada do que precisar explicar que o vovô que o filho visitava todo domingo faleceu e por isso eles não vão mais se ver. Ou então, explicar que ela não pode ir na casa do amiguinho porque está de castigo é mais fácil do que explicar que a mamãe e o papai não vão mais morar juntos porque estão se separando.
É natural sentir receio de falar de temas mais delicados, principalmente quando os sentimentos do adulto estão envolvidos. A pandemia do novo coronavírus está mexendo com todos. As pessoas estão sentindo receio, medo, angústia, insegurança e muito mais. É difícil explicar para as crianças algo que nem os próprios adultos entendem muito bem.
Sim, é muito difícil. Mas é necessário. Isso faz toda a diferença para a criança. E essa diferença não será sentida somente neste momento e neste caso do coronavírus. Não, esta diferença será sentida ao longo da vida da criança e poderá influenciar até mesmo na forma que a criança se torna um adulto. Isso porque a criança crescer sem ter amparo dos adultos para compreender o que está havendo na sua vida deixa marcas na vida da criança. Provavelmente, estas marcas a acompanharão na vida adulta.
Em contrapartida, os momentos de conversa e de amparo que os adultos dispõe às crianças também marcam sua infância. Nestes casos, as crianças compreendem que dialogar é importante e que isso pode servir para lidar com as emoções. Por isso, converse com seu filho sobre o novo coronavírus, mesmo que seja difícil.
Por que é importante falar com as crianças sobre o novo coronavírus?
Mãe sentada em sofá com filho pequeno – Foto: Freepik
É muito importante que as crianças tenham os cuidados mínimos de higiene e de distanciamento social. E é claro que é responsabilidade dos cuidadores garantir que isso esteja sendo feito de forma adequada. Entretanto, na medida que a própria criança “ajuda” nos cuidados a vida dos adultos se torna muito mais fácil.
Para que as crianças também se responsabilizem pelos seus cuidados e tomem certas precauções, é necessário que elas compreendam o que deve ser feito e porquê isso deve ser feito. Nenhuma criança lavará as próprias mãos com esmero dezenas vezes ao dia se não compreender as razões disso.
Entretanto, não é somente para explicar sobre os cuidados que a conversa sobre o novo coronavírus precisa ocorrer. Muito mais que isso, é preciso que os adultos abram espaços de diálogo para que as angústias e medos das crianças sejam devidamente acolhidos.
Muitas crianças estão ouvindo sobre morte todos os dias nas conversas entre os adultos, nas ligações telefônicas dos pais, na televisão e em todo lugar. Mas quais as consequências do tema morte estar tão presente e estar chegando nas crianças dessa forma?
Pode parecer surpreendente para alguns adultos, mas muitas crianças estão efetivamente desenvolvendo pânico com medo da morte. Muitas crianças estão acreditando que podem morrer a qualquer momento. O pediatra Patel relata que “Com tantas discussões sobre a covid-19, algo que os pais realmente precisam fazer é explicar às crianças que elas não vão morrer pelo coronavírus. É uma mensagem importante de ser transmitida”.
Os medos na infância
Especialistas em psicologia infantil reforçam que o medo na infância é algo normal. Sentir medo e criar fantasias é algo que faz parte do desenvolvimento normal. No entanto, as sensações de insegurança e de incerteza geradas por este momento podem agravar significativamente esses quadros considerados “normais” de medo. Isso significa que uma característica aparentemente normal (como o medo) pode se tornar algo mais sério, desencadeando problemas graves como pânico, fobia ou depressão infantil, por exemplo.
É normal que as crianças sintam medo e muitas vezes não consigam articular isso. Ou seja, é possível que as crianças estejam sofrendo com essas incertezas e inseguranças e não consigam elaborar, simbolizar, falar sobre isso. Entretanto, não é porque a criança não está falando que o problema não esteja lá. Ao contrário, muitas vezes o problema é justamente esse: quando se fala, é possível pedir ajuda, conversar, fazer trocas. Quando não fala, o monstro que amedronta o imaginário da criança não é desmistificado pelos adultos.
O que falar para as crianças sobre o novo coronavírus?
Pai e filho conversando sentados no sofá – Foto: Freepik
Além de explicarem que os filhos não vão morrer devido a pandemia do novo coronavírus, também é importante fazer as crianças se sentirem seguras. Para isso, uma dica é dizer para elas que elas estão protegidas das complicações mais graves. É importante destacar que tomando os cuidados necessários, o filho dificilmente terá qualquer problema. Mas para além disso, talvez também valha a pena os pais destacarem que mesmo que algo aconteça, a criança dificilmente será seriamente afetada.
Psiquiatra infantil e professora da Universidade de Turku (Finlândia), Linnea Karlsson relata que “Crianças e adolescentes estão preocupadas com suas famílias. Por isso, devemos explicar a elas que estas são circunstâncias excepcionais, ou não estaríamos exigindo as mudanças em sua rotina. Precisamos explicar que, nesta situação, devemos cuidar de todos, e não só de nós mesmos e nossas famílias“.
Ou seja, é importante explicar para os filhos que eles não vão morrer, que eles estão protegidos e que para garantir isso é importante tomarem os cuidados de isolamento e de higiene. Entretanto, também é importante fazê-los entender que tem outras pessoas que podem sofrer e por isso o distanciamento social é tão importante. Conte para seus filhos que o distanciamento pode ajudar as pessoas a não adoecerem.
Como acolher os sentimentos das crianças?
Além de explicar a situação, também é fundamental acolher o medo, os receios e os sentimentos do seu filho. Essa talvez seja a parte mais difícil da tarefa, na verdade. No entanto, ela é fundamental. Isso porque é com esse acolhimento e amparo que você poderá garantir que essa experiência da pandemia de coronavírus seja a menos traumática quanto for possível para seu filho.
Para acolher os sentimentos da criança o ponto inicial pode ser perguntar a ela se ela tem alguma dúvida. Deixe ela perguntar o que ela quiser, e responda com honestidade. É muito provável que hajam perguntas que você não terá resposta, perguntas que ninguém tem resposta ainda. Por exemplo:
- Por que isso está acontecendo?
- O que vai acontecer?
- Quando tudo isso vai acabar?
- Como vai ser quando tudo acabar?
Ao ouvir perguntas que você não tem resposta lembre-se de que as crianças estão assustadas e estarão prestando muita atenção nas respostas que você der. Por isso, não minta. Elas saberão que é mentira e lembrarão das mentiras contadas. Mentir neste momento pode ser pior do que não falar nada, dependendo do caso. Isso porque o sentimento de ansiedade, de insegurança e de incerteza crescerá muito se ela sentir que está sendo enganada.
Você não tem resposta? Então diga isso. Diga que você não sabe, que ninguém sabe. Mas não diga somente isso, diga também que você permanecerá do lado dela mesmo sem saber essas respostas. Repita quantas vezes forem necessárias que você cuidará dela e que tudo isso vai acabar, mesmo que vocês não saibam quando nem como.
A honestidade é sentida pelas crianças e ela traz a sensação de confiança. Neste momento, é disso que as crianças precisam.
Efeitos da pandemia do coronavírus: Isolamento social e suas consequências emocionais mais comuns
Mulher com máscara em quarentena olhando para as janelas – Foto: Freepik
Como todos sabemos, o isolamento e o distanciamento social são alguns dos cuidados mais importantes neste momento de pandemia do novo coronavírus. É importante que as crianças entendam que este é um cuidado importante e porque ele é tão importante, como mencionado acima.
No entanto, o isolamento social não vem de forma gratuita. Há um preço que deve ser pago por este cuidado. Isso porque o ato de se isolar pode acarretar uma série de efeitos emocionais negativos. As consequências de se manter isolado podem ser muitas e a forma de apresentação do sofrimento pode vir maquiada de muitas maneiras. Alguns dos problemas mais comuns desencadeados em situações de confinamento são, por exemplo:
- Pânico
- Fobias e medos
- Angústias
- Pesadelos
- Inquietações e hiperatividade
- Irritabilidade
- Depressão
- Ansiedades
E assim como os adultos, as crianças também podem vir a desenvolver esses e muitos outros problemas emocionais. Obviamente, estes problemas não somente dificultarão a capacidade da criança de lidar com esse momento como também poderão permanecer mesmo depois do fim do isolamento.
Dê atenção ao seu filho, olhe para ele e preste atenção nele. As crianças sentem quando são cuidadas, e sentem também quando não são. Cada família deve encontrar sua própria forma de interagir, de cuidar um dos outros e de atravessar este momento. No entanto, há algumas dicas básicas que podem ajudar as famílias e construírem essas formas de interação. Por exemplo:
- Olhe nos olhos da criança enquanto conversam e brincam, e faça isso diariamente
- Pergunte para a criança como ela está se sentindo não somente quando for explicar sobre a pandemia, mas regularmente
- Depois de perguntar sobre os sentimentos, olhe para ela e dê tempo para ela responder (não a apresse)
- Estimule que ela reflita e compartilhe seus sentimentos e seus medos
A quarentena com as crianças está sendo um momento muito difícil?
Menina em quarentena olhando a rua pela janela – Foto: Freepik
Muitas famílias estão sofrendo nessa pandemia do novo coronavírus. Os efeitos do isolamento, das incertezas e das tensões políticas podem afetar significativamente mesmo as pessoas que se consideram “mais equilibradas”. Isso é normal e pode acontecer com qualquer um.
O cenário de isolamento com crianças em casa pode agravar ainda mais a situação, principalmente casos de crianças que estão apresentando sintomas de que algo não vai bem. A agitação, a irritabilidade, dos pesadelos e a depressão entre as crianças podem levar os adultos a desgastes tremendos (além da preocupação com o que está havendo com os filhos).
Se estiver realmente difícil para você, vale lembrar que há uma série de psicólogas que estão realizando atendimentos Online com pais durante a quarentena. Entre outros fatores, estes trabalhos de acompanhamento de pais pode servir para orientar e ajudar os adultos a lidarem com as crianças e consigo mesmos neste momento.
Lembre-se que apesar do distanciamento social necessário, você não precisa enfrentar este momento de forma solitária. Converse com quem te faz bem e faça trocas de experiências e, se for necessário, busque ajuda profissional. Este momento vai passar e você pode enfrentá-lo com ajuda de alguém.
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