As brigas dentro de casa são um tema que costuma trazer muitas dúvidas para as famílias, principalmente para aquelas que buscam entender melhor o desenvolvimento das crianças. Hoje já sabemos que o “clima” do ambiente doméstico afeta significativamente o resto da vida das crianças. Mais do que afetar somente a relação da criança com os pais, estar exposto a brigas constantes ou muito intensas pode prejudicar a saúde mental e emocional das crianças, e também a forma como elas vêem o mundo e as pessoas.
É comum que depois das brigas o casal se resolva, mas a criança permanece aterrorizada por longos dias – mesmo depois de não haver mais “clima pesado” na casa. Uma série ampla de estudos demonstram que a forma como os pais se relacionam e resolvem seus problemas tem um papel muito importante no desenvolvimento da criança.
Veja aqui quais as consequências das brigas entre os pais no desenvolvimento da criança. Aprenda também algumas dicas de como é possível atravessar os conflitos de casal sem afetar o seu filho. Boa leitura!
De quais brigas estamos falando?
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Brigas e discussões são normais na vida de todas as pessoas, não é necessariamente esse o problema. Por exemplo, mesmo seu filho provavelmente, em algum momento, vai brigar na escola ou com os irmãos, e está tudo bem.
Diversas pesquisas já foram feitas sobre o assunto ao longo dos anos e em diversos países do mundo. De acordo com os estudos, discussões pequenas e corriqueiras costumam afetar muito pouco o desenvolvimento geral das crianças. Ainda que os pequenos se sintam preocupados no momento da turbulência, isso não costuma ter efeitos duradouros. Em contrapartida, as pesquisas vêm mostrando que as brigas entre pais que realmente interferem na vida das crianças são aquelas mais intensas.
Alguns dos comportamentos que ocorrem nos conflitos que costumam marcar de forma duradoura os filhos são:
- Gritos e alterações de voz
- Falas que demonstrem chantagem
- Violência física, verbal ou emocional
- Demonstrações mútuas de raiva
- Uma das partes ignorar o outro
Naturalmente, nem toda briga vai deixar marcas na memória da criança. Todavia, é muito importante que os pais e familiares tenham em mente que existem formas saudáveis de discordar. Compreender que formas são essas é essencial para garantir que os filhos não sejam prejudicados pela dinâmica de relacionamento dos adultos.
Quais as principais consequências?
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Já se sabe há muito tempo que conflitos e brigas entre pais e responsáveis podem afetar drasticamente a vida das crianças. Entretanto, o que a ciência descobriu mais recentemente é que não é somente a relação da criança com os pais e a infância que são afetadas. Além da infância e da relação familiar, toda a adolescência e vida adulta desses pequenos podem sofrer graves consequências devido aos conflitos mal resolvidos entre os seus pais ou cuidadores.
Uma revisão com centenas de estudos de vários países do mundo demonstraram que a lista de consequências para a vida da criança que é exposta a brigas é enorme. Veja aqui os efeitos mais comuns:
- Batimento cardíaco acelerado
- Nível elevado de estresse
- Formação de conexões neurais comprometida
- Prejuízo no desenvolvimento e amadurecimento do cérebro da criança
- Distúrbios do sono, incluindo medo de pegar no sono e/ou insônia
- Transtornos de ansiedade
- Depressão
- Insegurança
- Problemas de autoestima
- Terror noturno
- Bruxismo
- Alergias de pele
- Problemas escolares, incluindo indisciplina, problemas de comportamento e de concentração
- Irritabilidade e agressividade
- Tristeza
- Problemas nutricionais, incluindo obesidade e transtornos como anorexia e bulimia
- Enurese, dificuldade para parar de fazer xixi na cama ou voltar a fazer xixi na cama
- Encoprese, que é o comportamento da criança fazer cocô na cama
- Dificuldade acentuada de construir relações e socializar
- Automutilação
- Problemas de rendimento escolar
Além disso, é importante lembrar que as especialistas afirmam que não é só pelo medo desses problemas que os cuidadores devem evitar as brigas. Os adultos que desempenham o papel de cuidado (sejam os pais ou quem for) são a sustentação e a base das crianças. Por isso, é muito importante que esses adultos consigam dar bons exemplos e mostrar que a criança pode se sentir protegida com eles.
Brigas brandas, mas frequentes
Psicólogas especialistas em crianças também lembram que não importa se o casal mora junto ou não. Isso porque a qualidade e estabilidade do relacionamento dos adultos é central para o bom desenvolvimento da criança, independente dos pais serem casados ou não. Também não importa se a criança é filha biológica ou se foi adotada, os efeitos são os mesmos.
Por fim, os estudos mostram que as crianças que são expostas a brigas não tão intensas, mas muito frequentes, podem sofrer com os mesmos efeitos. Ou seja, mesmo que na sua casa não haja gritos e violências extremas, se a criança for exposta a discussões cotidianamente ela não estará livre dessa lista enorme de possíveis prejuízos.
E quando o assunto da briga é a criança?
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É muito importante lembrar que as brigas fazem parte de qualquer relação e que o problema não é o casal discordar eventualmente. A criança costuma sofrer prejuízos quando os adultos estão constantemente em conflito e quando a dinâmica da discussão é agressiva e intensa.
Além disso, o cenário se agrava – e muito! – quando o tema da discussão é a própria criança. É muito comum que as crianças sintam culpa nesses casos, de acordo com especialistas. Uma variedade de estudos mostra que as crianças costumam sentir que são responsáveis por toda aquela confusão que está acontecendo, e essa sensação é intensificada quando o tema da briga entre os adultos é ela.
Por isso, uma das possíveis estratégias para atenuar o problema é sempre conversar com a criança. É importante que a criança saiba que não é responsável pelos desentendimentos entre os adultos.
Outros tipos de brigas e os seus efeitos sobre o desenvolvimento da criança
Nem toda briga conta com gritos e uma série de confusões. Entretanto, isso não quer dizer que os efeitos sobre a criança são nulos.
As crianças são muito perceptíveis e é importante que os cuidadores aprendam como resolver seus conflitos sem onerar a saúde mental dos pequenos.
Veja aqui qual o efeito de outros modelos de discussão no desenvolvimento das crianças.
Ignorar resolve?
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Como muitos adultos já sabem que as brigas na frente das crianças as prejudicam, é muito comum que algumas famílias decidam não fazer mais “escândalos” na frente dos pequenos. Entretanto, a estratégia que muitos desses adultos escolhem é começar a ignorar o seu parceiro. Esse comportamento também é prejudicial aos pequenos, apesar dos pais não saberem disso.
Foi descoberto nos últimos anos que não são somente as brigas violentas que afetam a vida das crianças. Quando os adultos começam a se ignorar, o ambiente também se torna hostil para os pequenos. Além disso, ter comportamentos que mostrem que não há mais respeito mútuo no casal também atrapalha o bom desenvolvimento infantil.
A lista de consequências para esses casos é igual a anterior, já apresentada. Ou seja, crianças que são expostas a ambientes onde os adultos se ignoram ou mostram falta de respeito podem ser tão prejudicadas quanto aquelas que vêm de ambientes com brigas violentas e/ou frequentes.
Especialistas afirmam que as crianças que vêm desses contextos não têm somente as suas vidas prejudicadas. Elas aprendem a se relacionar desses modos e perpetuam esse tipo de resolução de conflitos nas suas novas famílias. Ou seja, há uma transmissão de geração em geração, que passa pelo aprendizado experienciado durante a infância. Muitos estudiosos do desenvolvimento infantil afirmam que a genética não é o principal responsável pelas características que as crianças repetem de seus pais. Para estes pesquisadores, o principal responsável por essa transmissão geracional é justamente a vivência nesse tipo de ambiente, e não um gene passado pela biologia.
Como “brigar” sem afetar o desenvolvimento da criança?
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Estudo conduzido pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) mostra que nem toda briga é ruim e é um problema. A professora responsável pela pesquisa afirma que os adultos precisam estar atentos para a presença de violência física ou psicológica. Isso porque, de acordo com a descoberta, as discussões podem até ser benéficas para o desenvolvimento infantil. Entretanto, para que o conflito traga benefícios, ele precisa permitir que a criança aprenda algo com ele.
O simples ato de discordar é normal. Apesar disso, é comum que mesmo discussões amenas tragam preocupações para a cabeça das crianças. Por isso, é recomendado que os adultos conversem com os filhos. Além de reiterar que eles não têm nenhuma culpa, também é importante que as crianças ouçam os pais dizendo que se respeitam e que estão apenas chateados.
O mais recomendado é que conflitos que envolvam o casal sejam devidamente discutidos fora de casa. Outra possibilidade também é ter essas discussões em casa em horários em que a criança não está presente. Reservar os horários em que a criança está dormindo, no banho ou em qualquer outra atividade – dentro de casa – não adianta, pois as crianças percebem que há algo de errado no ambiente, mesmo quando não estão no mesmo cômodo.
Mas… E se acontecer?
Apesar de todos os cuidados, é possível que brigas mais intensas aconteçam na frente dos filhos. Isso pode acontecer porque estamos falando de seres humanos, e nem sempre é fácil conter as emoções.
Nesses casos, o mais aconselhável é que os adultos expliquem o que houve para a criança. É muito importante que essa conversa aconteça com os dois adultos juntos, para a criança ver que, nem sempre, quando eles estiverem juntos, será uma discussão. Também é muito importante que os adultos procurem usar uma linguagem bastante simples, para garantir que a criança entenderá. Por fim, essa conversa deve não somente explicar o que houve, mas também falar do futuro: o que vai acontecer? Vai ficar tudo bem? Vão se separar?
E o divórcio?
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Apesar das dúvidas que ainda pairam sobre os adultos, hoje já se sabe que o divórcio ou a separação dos pais não tem efeito duradouro e prejudicial sobre as crianças. Muitos pais não sabem, mas alguns estudos mostram que o grande problema do divórcio não é a separação em si, mas as brigas que costumam acontecer antes, durante e depois da decisão.
Isso significa que crianças que vêm de lares com muitas brigas estão sujeitas a uma série de problemas no desenvolvimento, independente dos pais serem casados ou separados. Hoje existem alguns estudos, inclusive, que mostram que crianças que vêm de lares com pais divorciados, mas que não foram expostas a brigas, têm melhor desenvolvimento afetivo, social e comportamental do que crianças cujo pais são casados até hoje, mas não conseguem resolver seus conflitos. Ou seja, o divórcio pode até ser uma forma de proteger a saúde emocional e o bom desenvolvimento da criança.
Se o divórcio ocorrer, é fundamental que ambos os adultos mostrem respeito pelo ex-parceiro. Fazer chantagens emocionais, fazer a criança precisar escolher lados, envolvê-la nas brigas pós-separação e falar mal do ex-parceiro prejudicam o desenvolvimento da criança. Por isso, o caminho mais adequado é direcionar os possíveis sentimentos mal-resolvidos do fim da relação para a pessoa certa, deixando a criança longe disso.
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